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Crônica

Médico, chama de vida

Andreia Donadon Leal - Mestre em Literatura pela UFV

Publicado em 18/01/2019 às 02:53
Atualizado em

(Foto: Google Imagens)

Não gosto de ir a consultas médicas,tampouco de fazer exames clínicos; se nem dos de rotina, que diários complexos, que precisam de dietas preparatórias e anestesia para sua realização. Dizem serem necessários para manutenção da vida; estou quase calva de saber! Sei que médicos são fundamentais para tratarem a saúde. Há doença de todo tipo espalhada aos quatro cantos. Muitos estão cientes. Mas os que não? Os que vivem em lugares longínquos e de difícil acesso aos serviços públicos se saúde? Penso neles com frequência, em suas agruras, queixumes e dores diárias. Penso naqueles que não possuem planos de saúde, e têm que esperar na fila quilométrica e burocrática do SUS. Penso naquelas pessoas humildes que procuram políticos para desentravarem exames, consultas e exames a que têm direito. Penso no desânimo delas ao retornar para suas casas, sem previsão de atendimento. Penso no trabalho voluntário de alguns médicos que conheço. Penso nos profissionais de saúde que tiram dinheiro do próprio bolso, para minimizar o sofrimento alheio. Admiro esses anjos de luzes que espalham acolhimento. Há muita gente boa na terra! Também há, por certo, gente ruim por todos os cantos do mundo. Gente que maltrata gente. Gente que inveja gente. Gente que importuna gente. Gente que tem prazer em maltratar animais, crianças e idosos. Gente que pratica o mal. Gente que vigia a vida alheia. Gente que não deixa o outro conversar ou interagir. Gente que fala a torto e a direito sem ouvir o outro. Gente que se enlameia em confusões. Gente que a gente tem desejo de mandar às favas, para não dizer coisa pior. Gente aproveitadora. Gente oportunista. Gente que não respeita normas. Gente sem noção. Gente que se alegra com a desgraça dos outros. Gente que vive ferindo, com palavras chulas, seu semelhante. Gente que se sente superior aos outros. Gente vaidosa ao extremo (lembrando que vaidade equilibrada faz bem). Gente que é primeira pessoa no bem, mas terceira no mal. Gente que puxa-saco de político para se dar bem. Gente que não sabe trabalhar por relevantes serviços à humanidade. Há gente de todo tipo: boa, boníssima equilibrada, peça cada vez menos encontrada no ‘mercado’ da convivência. Médicos, altamente voltados para o bem-estar psicológico e físico de seus pacientes, que vão além da consulta feijão-com-arroz. Que vão além do entendi, jargão usado entre eles. Que vão além do atendimento básico. Que pesquisam incansavelmente as dores de seus pacientes. Já me tratei com todo quanto tipo de médico. Os que não mencionaram efeitos colaterais de terapias e medicamentos, apesar da existência das redes sociais, que escancaram portas e janelas para informações. Já tratei com os que nem olharam para meu rosto. Lembro-me de um excepcional, quase centenário, que me disse: ‘o rosto revela tantos sinais, que um bom médico consegue visualizar certas enfermidades’. Outra jovem médica, de espírito inovador, que produziu etiquetas e desenhos na receita, para um paciente analfabeto. Médico que receita alegria e felicidade para manutenção de uma vida saudável. Médico que enxerga além do corpo. Médico que sofre com o sofrimento alheio. Médico que disponibiliza número de telefone. Médico que trabalha voluntariamente em missões humanitárias. Médico que leva sua maleta até a casa do paciente, e não cobra pela consulta. Médico que atravessa rios, montanhas, lugares ermos, porque ama a arte do ofício. Médico que olha no olho. Médico que não desiste de paciente em estágio terminal. Médico que não larga seu posto por nada. Médico que vê além do óbvio e do protocolo. Médico que ‘revira ao avesso’ para saber se a saúde do paciente está, de fato, em pleno funcionamento. Médico que sempre diz em suas consultas palavras de encorajamento. Médico que não se sente acima do paciente. Médico que não se coloca entre os deuses. Médico que sente a dor do outro. Médico que insiste em curar, mesmo em casos incuráveis. Médico que vai além do tempo estimado da consulta. Médico que acompanha o paciente até a porta de saída do consultório. Médico com paciência de Jó. Médico de ferro e coração. Médico além do jaleco. Médico que sabe que é de pele e osso. Médico que nesse vasto mundo sabe que mais vasto é seu coração. Médico sábio da realidade de muitos brasileiros privados de seus direitos. Médico que batalha, dia após dia, pelo bem-estar. Médico Drumonndiano que “ama solenemente as palmas do deserto... ama o inóspito, o cru, um vaso sem flor, um chão de ferro, e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina sangrando no meio do asfalto”, doido para vê-la curada, o peito pulsante, o chão em brotos, o vaso florido – a seiva contida nas palmas do deserto, que um médico ausculta e... chama de vida!

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