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Crônica

Sua música e meu silêncio combinam!

Andreia Donadon Leal - Mestre em Literatura pela UFV

Publicado em 22/02/2019 às 08:18

(Foto: Google Imagens)

Vivemos a era do ruído. Nem precisaria complementar o texto com mais palavras, para discorrer sobre o assunto. Antes que o leitor termine esta linha e as seguintes, certamente escutará diversos sons misturados que se transformaram em ruídos. Se você está indo para o trabalho a pé de manhãzinha ouvirá sons menos poluídos, mas pulsantes desde cedo. Motores de automóveis, passos e conversas de pessoas, canto de pássaros, galos, etc. Mais tarde, os ruídos aumentam de intensidade, tornando o ambiente estupidamente poluído auditivamente. Som ligado no volume máximo (daquele ser quer não sabe respeitar o silêncio e o gosto alheio!); som de gritos, de máquinas, de marteladas, de telefones, de buzinas, de ares-condicionados (etc.), tudo isto listado, devidamente misturado; a soma do resultado é igual a ruídos que de longe ou de perto são incompreensíveis. Não há cabeça e ouvidos que suportem, com tranquilidade inabalável, tanta barulheira incessante ao longo da vida. O estresse vem à tona com eloquência, quase ou muitas vezes, tirando o ser da compostura de indivíduo educado. Nervos à flor da pele, cansaço, esgotamento, estresse e barulheira não combinam! O santo ‘final de semana’ tão aguardado, para relaxar o corpo e descansar os ouvidos, é pura quimera, quando alguém que mora perto de sua residência, resolve fazer uma festinha, com direito a som ligado no último volume. Perigo a vista! Presenciar brigas ou xingamentos por causa do som que invadiu o campo auditivo alheio, é regra. O bate-boca, quando vem à tona, vira ruído da ignorância, da agressividade, do desentendimento, do desrespeito, do mau-senso, da barbárie, e por aí vai; dependendo da acidez discursiva, somente convocando a, ‘polícia para quem precisa, polícia para quem precisa de polícia!’. A frase anterior não tem a menor graciosidade. A civilidade deveria ser empregada, sabendo chegar a um bom consenso para todos, sem intervenções. Mesmo assim, ainda não sei por que é tão difícil aceitar de bom grado o pedido do outro. Não é imposição pedir, ‘abaixe o volume do som, por favor’! O pedido tem a similaridade de inúmeras frases e motivos como, ‘meus ouvidos não suportam ouvir a sua música! Meus ouvidos precisam de pausa para ouvir meu silêncio, ou para ouvir meu filme, ou para ouvir minha música, ou para conversar com amigos em casa, ou para ouvir meu silêncio, ou para me recolher no silêncio do sono’...  ‘Minha cabeça parece que triplicou de peso, e não é nada aplicado à aquisição de mais massa cinzenta ou à proliferação de neurônios’! ‘Meus ouvidos já não conseguem distinguir tantos ruídos diferentes’. Tudo é balbúrdia, misturança de gritos, de músicas, de motores de veículos, de diversos sons arrastados. ‘Meu pedido de, ‘abaixe o volume do som, por favor’, não é autoritarismo. ‘É direito de exercer minha liberdade de não escutar sua música, assim como é seu direito de não querer escutar o meu silêncio’.

Imposição de silêncio, meus amigos, sem distinções de cor, raça, sexo, ou classe social, todos nós seremos vítimas um dia, pelo silêncio certeiro, impositivo e profundo da morte, que dá medo, pois não é o silêncio que grande parte da gente viva aprecia, como o som dos pássaros nas madrugadas mornas de verão, ou as pouco friorentas do inverno...  Enquanto tivermos vida, teremos o direito de exercer a liberdade, sabendo que os outros também têm seus direitos.  Você, no direito de ouvir sua música, eu no direito de ouvir meu silêncio, é igual a, nós, em sintonia harmoniosa com a arte de saber viver...

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